MUITO PRAZER vai para a última semana de filmagem

[Jorge Furtado (sentado, de óculos) com a sua equipe no set de “Muito Prazer”. / André Ávila / Agencia RBS]

DE MOTEL DESATIVADO AO PALÁCIO DA JUSTIÇA: NOVO FILME DE JORGE FURTADO É RODADO EM PORTO ALEGRE
Carlos Redel
Zero Hora, 02/07/2025 - 17h37min

/ Com estreia prevista para 2026, a comédia “Muito Prazer” tem Daniel de Oliveira, Luisa Arraes e Samantha Jones como protagonistas

-- Existe um assunto que é tabu, mas muito interessante, que é a indústria dos vídeos pornográficos na internet. Os dois maiores sites de pornografia, juntos, têm mais que o dobro de visitas que o Instagram. E esses vídeos são, na minha opinião, um raio-x da sexualidade humana. A pornografia escuta e investiga os desejos, os prazeres e os fetiches de milhões de pessoas por dia - conta o diretor e roteirista Jorge Furtado.

E foi com este mote, baseado em profundas pesquisas sobre o universo erótico no mundo digital, que o cineasta desenvolveu o roteiro de Muito Prazer, seu mais novo longa-metragem que está sendo atualmente rodado na Capital.

A produção já foi filmada em um motel desativado na Zona Sul e também passou pelo Palácio da Justiça, no Centro Histórico. Foi lá que a equipe da Casa de Cinema de Porto Alegre recebeu a reportagem de Zero Hora para uma visita ao set.

Para a filmagem, uma equipe de 104 pessoas estava envolvida - incluindo o trio protagonista, formado por Daniel de Oliveira, Luisa Arraes e Samantha Jones. Na cena em questão, os personagens do longa prestavam esclarecimentos perante uma juíza, depois de se meterem em uma série de confusões envolvendo a venda de vídeos pornográficos ilegais.

Mesmo sendo um pequeno fragmento do filme, era possível observar a sagacidade da direção de Furtado somada com, é claro, uma comédia esperta que leva a inconfundível assinatura do roteirista.

Entre o absurdo e a realidade

Nos bastidores, toda a equipe estava alinhada e disposta a entregar o seu melhor, tanto é que repetiam as cenas quantas vezes fosse necessário. Queriam chegar na dose certeira de humor, sem descambar para o bobo.

Furtado, aos 66 anos, com mais de quatro décadas de carreira, sabe que a graça está nos detalhes da situação, no andar sobre a linha entre o absurdo e a vida real. Tanto é que, em determinado momento da filmagem, atento aos seus monitores, depois de posicionar cuidadosamente os seus atores, pede para refazer, com a justificativa:

-- Ficou meio palhaçada demais. Vamos fazer novamente.

Na sequência, enxergando o equilíbrio perfeito, ele comemorou:

-- Essa é a boa! Essa é a boa!

Os atores, imediatamente, foram para trás do monitor com o objetivo de revisar, ao lado do diretor, se a cena havia dado certo. Todos caíram na risada ao verem o trabalho na tela. É o sinal de que realmente funcionou. Já era possível partir para as próximas tomadas. Foram horas de trabalho para a extração de uma sequência de menos de um minuto. É o repetitivo, demorado e minucioso trabalho de fazer cinema.

Este trabalho, também, que necessita de atenção: em uma das diárias, correndo no set para revisar uma das cenas, para não perder a luz do sol da Capital, Furtado tropeçou nos cabos, caiu e quebrou o pulso. Agora, está dirigindo o filme com o braço engessado e com uma tipoia. Mas tudo seguindo a pleno vapor.

“Não sabia que fazia um frio desses no Brasil”

Muito Prazer começou a sua rodagem na Capital em 8 de junho e tem previsão de 25 diárias. Ou seja, o trio protagonista, que veio de outros Estados, está enfrentando a rigorosa onda de frio que paira sobre o Rio Grande do Sul. E seguirá por aqui por mais alguns dias.

-- É maravilhosa a oportunidade de sentir mais frio. Sou de Belo Horizonte, sinto um pouco de frio, às vezes, mas não tanto assim no dia a dia. É gostoso sentir esse friozinho - destaca Daniel de Oliveira.

Luisa Arraes, por sua vez, se surpreendeu com as baixas temperaturas - tanto é que, em uma das vindas da artista para Porto Alegre, ela chegou no aeroporto e brincou de soltar vapor pela boca, tamanho o frio que fazia, e compartilhou em suas redes sociais o momento.

-- Sou do Rio de Janeiro, um pouco de Recife também. Não estou acostumada com esse frio todo. Na verdade, não sabia que fazia um frio desses no Brasil (risos) - disse a artista.

Já com a questão da chuva, que atingiu intensamente o Estado em junho, foi necessário montar uma força-tarefa para contornar as incessantes precipitações - quando o aguaceiro dava uma brecha, eles conseguiam sair e gravar as externas. Todo mundo de sobreaviso.

-- A gente venceu esse primeiro desafio, que foi fazer essas externas principais, com mais figuração, carros, mas foi no drible: “Hoje, choveu, então troca”, “hoje, a chuva deu uma aliviada, vamos fazer” - explica Furtado.

No mundo da Casa de Cinema

Na trama de Muito Prazer, Rubem (Daniel de Oliveira) herda um motel decadente. Ao fazer o reconhecimento da sua propriedade, descobre que uma ex-funcionária, Grace (Luisa Arraes), segue morando por lá. Juntos, decidem reabrir o empreendimento.

Porém, com o movimento baixo, para pagar as contas, a dupla tem a ideia de captar e vender vídeos dos clientes, com câmeras escondidas, para sites de pornografia, ocultado o rosto dos casais, com a ajuda de Nalva (Samantha Jones). O plano dá muito certo até o trio ser descoberto.

-- A tese do filme é que a paixão não tem algoritmo. Tem gente que gosta de cena de sexo na piscina, de cena de sexo em público. Tem gente que gosta de coletivo, trisal, cenas na praia, mas não tem como saber isso de antemão. Então, a procura é muito mais interessante que o encontro - revela Furtado.

Este pitoresco e criativo ponto de partida, juntamente com o profissionalismo e o acolhimento oferecidos pela equipe da Casa de Cinema de Porto Alegre - da qual Furtado e a produtora Nora Goulart são sócios - encantam os artistas, que fazem questão de voltar a trabalhar com a produtora.

-- Gravar com a Casa de Cinema é sempre muito bom. Já trabalhei com eles algumas vezes. Me sinto em casa, mesmo. A nossa produtora, a Nora, é ótima, e trabalhar com o Jorge Furtado é um sonho para qualquer ator. Está sendo lindo estar aqui - diz Daniel de Oliveira.

Luisa Arraes compartilha da mesma opinião que o colega de elenco e vai além:

-- Trabalhar na Casa de Cinema é um sonho de consumo. Quem já conhece está fodido, porque só quer trabalhar aqui. E quem não conhece está vivendo a benção da ignorância (risos).

Já para Samantha Jones, que faz a sua estreia na produção gaúcha, a experiência em solo gaúcho está sendo a melhor possível:

-- Sempre ouvi falar muito bem. Trabalhar no Rio Grande do Sul, conhecer o Estado, me deixa muito feliz. Estou sendo muito bem tratada, indo a lugares maravilhosos, com pessoas incríveis e profissionais que admiro há muito tempo. Está sendo, realmente, um prazerzão.

O motel

Para representar o empreendimento herdado por Rubem, o Motel Pérola, a equipe da Casa de Cinema de Porto Alegre encontrou, de fato, um motel. O Skylab, desativado, que fica na Avenida Eduardo Prado, no bairro Ipanema.

Por lá, transformaram a estrutura para se adequar ao roteiro, necessitando de dois cenários diferentes - antes e depois da chegada de Rubem e a reativação do espaço. Para esta missão, a Casa de Cinema chamou para a direção de arte Dayane Paz e o colaborador veterano dos filmes de Furtado, Fiapo Barth - aquele mesmo, o dono do Bar Ocidente.

-- A coisa mais desafiadora foi criar este motel temático por dentro, porque a gente filmou em um motel abandonado. Então, todos os interiores são de estúdio. Tivemos que criar tudo, porque são duas épocas: quando o Rubem encontrou o motel e, depois, todo o motel temático como eles conceberam e fizeram.

Fiapo comemora a parceria de décadas com Furtado fazendo, inclusive, clássicos ao lado do cineasta, como O Homem Que Copiava (2003), sempre assinando a direção de arte:

-- É sempre bacana filmar com o Jorge. Sempre dá muito prazer (risos) em fazer o trabalho. A Casa de Cinema é um lugar excelente para se trabalhar, dando total condições para o trabalho. Quando a gente vai para o estúdio, é quando a fantasia corre solta, porque não tem mais as regras do mundo real. É tudo comédia.

Furtado complementa:

-- Está sendo uma mobilização enorme, uma equipe gigantesca só para fazermos uma piada. É tudo sério, seríssimo, mas o resultado final é o humor. É uma comédia romântica. A gente faz sempre o mesmo filme, com a história “rapaz se apaixona por moça”, como O Homem que Copiava, Meu Tio Matou um Cara, Houve uma vez Dois Verões. Até Saneamento Básico. É um barato.